quinta-feira, 3 de julho de 2008

EU ACREDITO – MAIS UMA RODRIGUIANA

Um espetáculo digno de Nelson Rodrigues calou o Maracanã nesta quarta-feira, 02 de julho de 2008. Com heróis e anti-heróis cotidianos que parecem ter saído de um texto do escritor tricolor, o Fluminense sofreu a pior derrota de sua história, no estádio que leva o nome do jornalista Mário Filho, irmão do criador de personagens como Gravatinha e Sobrenatural de Almeida, que ilustravam suas crônicas esportivas.
E a tragédia já estava anunciada desde os jogos contra São Paulo e Boca, onde o tradicional clube, com sede na Rua Pinheiro Machado, no bairro das Laranjeiras, alcançou a classificação em batalhas heróicas.
Mas foi em Quito que a tinta da caneta de Nelson ficou mais evidente. O inesperado apagar das luzes do time brasileiro no primeiro tempo da partida na altitude deu tons mais dramáticos aos jogos mais importantes da vida do Fluminense Football Club. Na coxia do estádio equatoriano, o gaúcho treinador da equipe carioca conseguiu que Neves, seu protagonista, conseguisse status de herói, na segunda etapa, ao marcar o tento que daria algum tipo de alento e motivação à platéia no Brasil. Além disso, o até então vilão com nome de presidente aparecia agora como fiel escudeiro do mocinho tricolor.
Festa nas Laranjeiras, muita música, torcedores cantando a crença, mas sem a fé de ser campeão. Mas o Papa, com um carisma digno de Bento XVI, distribuía pó-de-arroz e fogos na anunciação da redenção tricolor. Este era um protótipo do cenário do último ato, num palco marcado pela tragédia da Copa de 1950.
Nelson descreve de forma monumental os atos finais de seu último ensaio. Em um texto bastante atualizado, os guerreiros entram com o manto verde, branco e grená sob uma festa apoteótica, carregada de esperança e amor pela conquista quase impossível. A batalha começa e a dramaticidade aumenta aos cinco minutos de espetáculo, quando os gladiadores equatorianos – com um reforço paraguaio e três argentinos – conseguem mais um golpe mortal diante de uma platéia perplexa. Mas aí entra em campo o Gravatinha rodriguiano, encarregado de guiar Neves, o herói tricolor, em busca da conquista impossível. Mas, a tragédia ganhou tons de um final feliz aos doze minutos do segundo tempo regulamentar, com Neves desferindo três golpes e igualando o adverso placar.
Ao contrário do lutador que aproveita o mau momento do adversário para conquistar o nocaute, o Fluminense estava satisfeito com o empate alcançado. Com o fim da prorrogação, todo o público estava de olho nos tiros livres executados da marca do pênalti. Mais uma tragédia de Nelson chegava ao ápice. E para ser completa, o choro era necessário. E o herói da decisão ganhou status de vilão, ao lado de dois dos seus principais companheiros, ao errar, de forma bisonha, na hora do ato final. LDU conquista o primeiro título para o Equador na Copa dos Libertadores da América. O maracanã aplaude e se cala resignado, no ensurdecedor barulho, citado pelo carrasco uruguaio há 58 anos.

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